sábado, 4 de julho de 2009

Berenice Abbott





Ela foi a primeira fotógrafa a ser admitida na Academia Americana de Artes e Letras, em 1983, quando já octogenária. Foi assistente de Man Ray até o dia em que a mega-mecenas Peggy Guggenheim negou-se a posar para o fotógrafo surrealista e disse preferir os serviços dela, a aprendiz. Viveu o auge dos loucos anos entre o Greenwich Village novaiorquino, a Rive Gauche parisiense e a vida boêmia de Berlim. E era lésbica.

Berenice Abbott nasceu em Springfield, Ohio, no dia 17 de julho de 1898. Mal terminou a adolescência, mudou-se para a cosmopolita Nova York onde deu de cara com uma das trupes de teatro mais bacanas da cidade: o Provincetown Players, grupo de vanguarda que revelou os escritores Eugene O’Neill e Djuna Barnes. Tornou-se mais uma da turma até que, em 1921, como quase todos os artistas do Greenwich Village e com apenas seis dólares no bolso, partiu para a Europa com planos para uma vida nova. Disse a quem ficava que, se era para morrer de fome, melhor morrer em Paris.
Não morreu de fome, mas pode-se dizer que morreu de amores. Sua carrasca e algoz foi uma escultora americana que conheceu durante uma breve mas inesquecível estada em Berlim.

Seu nome era Thelma Wood, tida como irresistível, um animal sexual, uma beberrona andrógina que usava os cabelos curtos e seduzia a todos. Abbott não resistiu e apaixonou-se por Thelma. Thelma também se apaixonou – por algum tempo... Até entrar em cena a escritora Djuna Barnes, antiga conhecida de Abbott, que foi apresentada a Thelma, e elas caíram de amores deixando Berenice a ver navios. Abbott jamais perdoou Djuna por ter lhe roubado a namorada, mas nunca hostilizou Thelma. Talvez porque soubesse que Thelma era assim mesmo, irremediavelmente sedutora – o que Djuna Barnes haveria de descobrir alguns anos depois, para seu enorme desgosto.

Deixando Thelma, Djuna e Berlim para trás, Berenice voltou a Paris onde começou a ganhar um dinheirinho como assistente de outro camarada do Village, o fotógrafo Man Ray. Com Ray ela aprendeu tudo sobre fotografia e logo colocou suas asinhas para fora. Revelando-se uma excelente retratista, Abbott passou a ser mais e mais solicitada por alguns clientes bacanas, como Peggy Guggenheim, despertando um enorme ciúme em Ray. Ela, que já era famosa pela falta de diplomacia, brigou com o fotógrafo e largou o emprego.

Mas andar com suas próprias pernas não foi tão difícil e o sucesso logo bateu à sua porta. Abbott fotografou muito artista interessante (até a sua desafeta Djuna e sua ex Thelma) e ainda tinha tempo e dinheiro para gastar na noite parisiense. Certa vez, ela a namoradinha da hora, a atriz Eva La Gallienne, resolveram arriscar-se pelos barzinhos lésbicos mais barra pesada e acabaram detidas pela polícia. Bons tempos, loucos anos!


Logo após a depressão americana de 1929 Abbott resolveu que era hora de voltar a Nova York e iniciou seu longo projeto “Changing New York”, um registro fotográfico dos prédios, da população e da paisagem urbana cada vez mais em mutação. Este acabou se tornando seu trabalho mais conhecido, e pelo qual ela é hoje considerada um gênio da fotografia. Depois, na década de 1950, passou a atuar na área científica, fotografando campos magnéticos e pêndulos, colocando a imagem a serviço da ciência. Abbott foi inventora de algumas tecnologias e aparelhos fotográficos, mas perdeu muito dinheiro com essas invenções que, apesar de geniais, eram pouco comerciais.

Ao final da vida contraiu um enfisema, fruto de muitos anos respirando produtos químicos para revelar filmes, muito tempo fotografando ao relento no alto dos prédios nova-iorquinos e décadas fumando os habituais e indispensáveis cigarros. Morreu tranqüila num mês de dezembro de 1991, aos 93 anos de idade.


Mais imagens de “Changing New York” na página:
http://www.nypl.org/research/chss/spe/art/photo/abbottex/abbott.html

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