sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Closer - Perto Demais


Quando eu assisti Closer, eu saí do cinema sufocada, sem ar, sem chão... Estava sozinha. E enquanto eu caminhava para o estacionamento eu me sentia à milhas de distância de qualquer ser humano. O que havia acontecido com os finais felizes das comédias românticas? Conhecer alguém, se apaixonar e a partir dali a sua vida passar a fazer sentido. No fundo é isso que queremos, não é? Um sentido para nossas vidas. Estamos todos perdidos... E um dia nos disseram que esse sentido estava no amor. E vários outros passaram a repetir essa ideia em músicas, livros, filmes... que fazem muito sucesso. Principalmente se são lançados perto do dia dos namorados - a segunda data mais lucrativa para o comércio. Transformaram o amor em um produto, tão vazio de sentido quanto qualquer outro. Se não satisfaz suas expectativas, você simplesmente joga fora e procura outro. Esse é o jogo. Inverteram a ordem das coisas. Primeiro idealizamos o nosso futuro relacionamento, depois listamos os requisitos de nosso competidor, depois realizamos alguns test-drive para encontrar algum que preencha boa parte deles. Só que ao mesmo tempo que estamos testando, também estamos sendo testados. Então, os dois jogadores resolveram adotar a mesma estratégia: manter as relações o mais superficial possível. Assim, evitam dois problemas: correr o risco de deixar transparecer algum de seus defeitos e constatar que o oponente o considera inaceitável ou correr o risco de se apaixonar por alguém que não preenche seus requisitos. Desse jogo só há dois finais possíveis: cansar de jogar e se desiludir completamente com o amor ou cansar de jogar e se contentar com um que não preencha os requisitos para poder continuar com o sonho. Até que um dia o sonho acaba. Isso quer dizer que o amor não existe ou que perdemos nossa capacidade de amar? Nenhum dos dois... Eu fui ao cinema sem saber o que esperar... na primeira cena, um casal caminha um em direção ao outro com uma música na qual só consegui prestar atenção no trecho "I can't take my eyes off you", que se repete incessantemente enquanto os dois não conseguem mesmo tirar os olhos um do outro. Até que, por esse mesmo motivo, ela é atropelada. Algumas feridas. Dói. Mas ela vai sobreviver. No final, a mesma música. Mas após um casal desfeito e outro unido pela comodidade e a covardia, passamos a prestar atenção em outros trechos da música: "life goes easy on me, most of the time" e "no love, no glory, no hero in her sky". Quem consegue encontrar o chão depois disso? Onde poderemos nos segurar? É isso que acontece quando se chega perto demais. Quando nos envolvemos, nos entregamos, nos tornamos vulneráveis. Quem vai querer isso quando se pode ter a segurança da superficialidade, dos sonhos pré-fabricados? Eu quero! Talvez eu seja um pouco masoquista. Mas precisamos ser um pouco para querer viver. Dói, mas a gente sobrevive. Evitar a dor é evitar viver. Eu vivi por muito tempo no meu mundinho, meu refúgio. Construí do jeito que eu quis. E construí também um senso de self. Eu sabia exatamente quem eu era, do que eu gostava, o que me deixava triste, o que deixava alegre, o que me trazia certezas e o que me fazia duvidar. E sem sair de lá eu só observava o jogo superficial, preferia só sonhar... era mais seguro ainda. Até que resolvi brincar um pouco... mas não sei jogar esse jogo... ganhando ou perdendo eu sempre perdia... perdia a chance de sentir alguma coisa. Até que um dia, sem perceber, fui parar em um relacionamento como o de Closer e percebi o efeito que a vulnerabilidade tinha em mim. Descobri sentimentos que até então desconhecia. Experimentei raiva, rancor, ódio, dor, muita dor. E vi que poderia ser tão egoísta a ponto de ferir sem perceber. E quando eu percebia doía muito mais em mim. Mas ao mesmo tempo eu ia descobrindo também a enorme capacidade que eu tinha de me doar. De colocar a felicidade do outro antes das minhas vontades - e descobrir que isso me trazia muito mais felicidade do que satisfazer as minhas vontades. De acreditar na humanidade. De poder fazer absolutamente qualquer coisa. E entre expectativas e decepções, meu humor oscilava em uma velocidade incrível. E alguém que sempre teve dificuldade para expressar os sentimentos passou a ter uma enorme dificuldade para escondê-los. Minha vida era um turbilhão de emoções e eu não tinha mais nenhum controle sobre elas. Mas, Drummond estava certo, a dor é inevitável, o sofrimento é opcional. A gente sofre até quando a gente se permite sofrer. Eu sofria porque eu estava cega. Eu não tinha entendido ainda. O que eu sabia sobre mim era muito pouco... "Só através dos olhos dos outros posso ter acesso à minha própria essência, ainda que temporária" (Sartre). Eu preciso do outro. Só no meu mundinho, eu não consigo ter acesso a quem eu sou e o que sou capaz de fazer pelos outros. Eu estava aprendendo a amar. O amor não é esse produto pronto que cabe numa caixa de bombons. O amor é um sentimento forte, poderoso, que nos deixa totalmente expostos, nos obrigando a aprender a confiar. Confiar que o amor por si só já vale a pena... não podemos esperar algo em troca, não podemos ter certeza que não nos deixarão, não podemos esperar satisfazer nossas expectativas, não podemos esperar que façam sempre o que faríamos naquela situação, porque não sabemos ao certo o que faríamos em qualquer situação... o mundo que funciona na nossa cabeça, só funciona na nossa cabeça. Não devemos acabar com o nosso mundo, mas descobrir como conhecer o mundo dos outros pode transformá-lo... sem medo... a gente sobrevive sempre... e cada vez melhor... o amor vem acompanhado de uma série de outros sentimentos que só com muito treino a gente aprende a controlar. E é isso que quero. A oportunidade de poder treinar. Talvez eu passe a vida inteira para aprender a amar. E quero encontrar várias raposas querendo ser cativadas e vários pequenos príncipes querendo cativar. Não para nos completarmos e vivermos felizes para sempre, mas para juntos aprendermos a amar. De várias maneiras... Há tantas formas de amar e tantas formas de demonstrar esse amor. E construiremos mundos juntos... Há vários mundos possíveis também... Mas isso só é possível de perto... bem de perto.

3 comentários:

Elis disse...

Li sua postagem e fiz uma leitura do filme bem diferente da que você fez. Aconteceu um amor pleno ali, com mais verdade na mentira do que na verdade. Lembra que o bonitão (falo do casal da cena inicial) era totalmente a favor da verdade mas agia como um canalha? E ela escondia mil coisas e agia com lealdade. Quem amou de forma mais verdadeira? Foi isso que me chocou no filme, já que sempre fui adepta da "verdade doa a quem doer".

Familia Lioncourt disse...

uau em...

Elektra Miller disse...

Você escreve bem, suas palavras nos remetem para realidade que não queremos ver, isso é magno, pois fazer pessoas estranhas refletirem sobre a vida através da sua perspectiva a respeito de um filme...
Parabéns!!!!
Deve haver muito mais coisas interessantes em você...
Elektra Miller