quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Perfeito comentário sobre a declaração do Papa!!!

Perfeita a celebração do espírito natalino pelo Bento XVI: quer coisa mais fraterna que comparar nós, gays e filhos de Deus, com as florestas tropicais? Tudo bem que eu tenho este DNA de Carmem Miranda, onde sempre cabe mais uma palmeira ou um abacaxi; mas daí a dizer que salvar as matas virgens seria, para ele, tão importante quanto salvar a humanidade da prática homossexual, me parece uma supervalorização de questão tão.... tão.... gozada! Um doce, esta criatura santificada, né não? Mas alguém precisa explicar pro supremo sacerdote que a importância da selva é justamente a bio-diversidade. Muita coisa viva diferente, vivendo em paz, cada qual com seu cada um. Precisamos aprender com as folhagens, que nos ensinam que tem lugar para tudo e todos, dos vermes aos deuses, e já que a maioria vai continuar se reproduzindo, mesmo, da forma papai e mamãe, a perpetuação das espécies estará garantida. Além disso, temos que garantir a felicidade que vem da verdade interior de cada ser vivente. Lá tem macaco, boto, borboleta, árvores diversas, insetos inimagináveis. Tem até boto-cor-de-rosa, como este que vos escreve. O que não significa dizer que não existam mariposas que transam com outras mariposas do mesmo sexo, ou mesmo uma árvore que sinta desejo de não transar com árvore, mas sim com as águas do igarapé. Todos têm direito sobre seus desejos e sexualidades. Precisamos parar de temer o diferente, porque o mundo não é gay, e os heteros não precisam se preocupar com a premissa: "todo mundo vai virar gay!". Não, não vai acontecer porque não vai, e pronto. Desde que o mundo é mundo que é assim. Nos deixem em paz, porque nós temos deixado vocês viverem em paz há milênios. Parem de nos demonizar, parem de nos perseguir. Há coisas mais importantes a fazer, para o bem da humanidade, seja lá que sexo ela pratique. Que insistência, que fixação em pênis, ânus e vagina, meu Deus. Porque nós gays seríamos a destruição da humanidade, se respeitamos pai e mãe, se somos cumpridores de nossos deveres? Será porque exigimos nossos direitos? Será que os católicos acham que só existem ônus, e nenhum prazer? Talvez seja isto que explique a hipocrisia destes fervorosos que são flagrados diariamente fazendo o que todos fazem: correr atrás de suas realizações mais íntimas.
Quanto a "ouvir a linguagem da criação", ouço-a diariamente. Respeito-a, mas não a pratico, no sentido estrito de transar com mulheres. Rezo do meu jeito por todas as famílias, sempre que encontro uma grávida, carinhosamente saúdo-a com "paz para seu bebê", não cobiço (só um ou outro, mas me controlo, porque ninguém é de ferro; mas vai dizer que isto os católicos também não o fazem?) e admiro homens casados que amam suas mulheres, estarei sempre pronto a ajudar um idoso, não humilho subalternos no serviço, contribuo com creches e asilos sempre que posso, dou bom dia aos porteiros e vizinhos, mas em nenhum momento nego o que há de mais profundo em minha alma, minha atração por homens. Ciente de que não fui criado pelo sexo praticado entre iguais, que não sou produto carnal do amor homossexual, nem por isso me acho merecedor da frase de que "para salvar a humanidade é preciso exterminar o comportamento homossexual". E confesso que preferiria a morte, a sobreviver tendo que me casar com uma mulher e ter filhos com ela. Não, obrigado. Não nasci para o fingimento, e se a outra opção católica é a abstinência, sinto muito mas a-do-ro sexo com nascidos iguais a mim. A linguagem da criação vai continuar, ela é linda, mas não é a minha praia e pronto.
A expressão ecologia-humana é interessante, porque ecologia seriam as relações entre o meio ambiente e a vida, tão diversa e maravilhosa. Leopardos negros, pintados, pintosas, jaguatiricas, onças, tudo felino, mas tudo tão belamente variante. Narizes de batata, cabelos pichain, fios lisíssimos das orientais, árabes-mamelucos, nada disso me leva ao fundamentalismo do dizer papal: "quem não dançar conforme a nossa música, está fora". Se fosse fora do baile dele, eu até aceitaria, mas ele prega que eu estou fora da ecologia humana, e que eu tenho que desaparecer para salvá-la. Ui! Muito forte. Me excomungar e me proibir de entrar em seus templos, acho até que ele tem este direito, porque no fundo de minha alma não aceito seus dogmas, mas eu, ao contrário dele, não acho que seria uma salvação para a humanidade protegê-la contra o pensamento dele. As pessoas podem acreditar no que quiserem, mas não podem ser excludentes. Quem não pensar igual a mim não precisa desaparecer. Porque aí elas jogam aviões contra edifícios, em nome de Deus. Este tipo de mensagem religiosa é barra pesada, porque põe dois lados em pé de guerra. U-ó!
Não é metafísica superada, mas é incompleta, a igreja só contemplar como aceitável falar da natureza humana como homem e mulher dotados de sexualidade única. Gays são homens e mulheres dotados de outra libido, que não aceitam fingir para agradar ou se encaixar em tal metafísica. Existimos para exemplificar que esta metafísica propõe a mentira e a dor de se ser o que não se é. Proponho a metafísica da liberdade, onda cada um conta o que gosta, e a partir daí criaremos o sistema filosófico que não vai associar gosto sexual à qualidade do espírito. Nem todo hetero presta, nem toda a bicha é desumana. O que se faz na cama não define caráter nem humanismo.
"Desvio, irregularidade, ferida....". Ferir é a palavra de ordem das declarações do Vaticano. Ferir no âmago, dilacerar corações. Inquisição do terceiro milênio, cruzada anti-gay, absolutismo não esclarecido. Já foram mulheres-bruxas queimadas, já foram índios do novo mundo catequizados e dizimados, já foram negros africanos sem alma escravizados em nome de Deus. O alvo agora somos nós, gays, que desaparecidos, salvaríamos o mundo (que tenta tolamente só salvar oceanos, baleias e florestas), e segundo a máxima cristã de agora, têm que focar nesta nova salvação. Era tudo o que se precisava no final de um ano de intolerância e dor, que começou com um "porque não te calas?" do rei rico para o terceiro-mundista com cara de bugre, e terminou com uma sapatada ao cachorro-louco. Muitos outros exemplos de intolerância religiosa virão. Mas não podemos confundir as divinas e generosas ações do Criador com a manipulação humana de suas grandezas que as igrejas são. Há luz, há energia, há amor pairando no ar. Que 2009 seja repleto de democracia, verdade, liberdade e respeito à diversidade. Que arara não precise agir como periquito para poder pertencer ao grande espetáculo da criação. Somos criaturas de um criador maravilhoso, independente de religiões, e teremos sempre que honrar seu magnânimo exemplo de entendimento e riqueza de formas de vida. Ele criou a multiplicidade. De famílias, inclusive. Cristo, Alá, Tupã, Olorum, Buda, Nzambi, todos os Criadores de mãos dadas, brincando de ciranda em volta do planeta terra, na noite de ano-novo, para garantir o mais precioso bem guardado pelos corações venturosos: o bem, sem olhar a quem....

Creditos:Milton Cunha
http://odia.terra.com.br/blog/miltoncunha/

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Meu filho me pediu uma boneca

Um texto tão bom como esse, dispensa comentários:
Há uns dois meses meu filho de sete anos me pediu uma boneca. Dividida entre a intelectualidade dos estudos acadêmicos e os valores que a nossa “reaça” sociedade demonstra nas questões de gênero, dei a boneca," bancando" um barulho enorme por parte da família, colegas de trabalho, ex-marido e afins. Sem contar com a censura silenciosa de alguns, revelada por olhares ou gestos. É claro que recebi apoio e solidariedade. Mas o oposto foi muito mais pesado. Confesso que compreendo. Por parte de alguns mais, por parte de outros, menos. Mas respeito.

O meu desconforto foi muito mais em relação a mim mesma do que às posturas percebidas, públicas ou anônimas, verdadeiras ou educadas. Foi duro encarar minha insegurança em assumir DE FATO uma posição em relação às minorias sociais. Foi esta imagem, refletida no espelho das relações familiares que meu filho e sua boneca me obrigaram a olhar. Tive que sustentar uma postura prática que há muito considerava como minha. Em teoria. Só descobri isto quando foi com um filho meu.

Aqui faço um parêntese: enquanto eu me torcia e retorcia constrangida, fazendo como o anão de jardim "cara de paisagem”, meu filho não estava nem aí para os olhares e comentários sobre meninos e bonecas e exibia orgulhoso a sua gorducha bailarina, penteando os seus cabelos, trocando as suas roupas, mudando o seu penteado, entre extasiado e maravilhado com as possibilidades daquele "ser" de 20 e poucos centímetros e puro látex, para onde ia: no meu trabalho, no Mestrado, pelas ruas, na casa do avô, do pai...lugares públicos ou privados para este menino não dizam nada! A cada um que afirmava que boneca não era coisa de "macho", ele perguntava candidamente: por quê?

A boneca para o meu filho foi um Lego às avessas: montava, desmontava, descobria as calcinhas (olha mamãe a calcinha dela!) maquiava, lavava, alimentava... Confesso: quando ninguém estava olhando, brincava junto com ele e me divertia à beça, me sentindo criança de novo, relembrando o prazer de simplesmente brincar!

Enquanto isso, na vida real as opiniões se dividiam entre as seguintes opções:

OPÇÃO A: Não é nada demais, é só uma fase, (os conservadores, mal disfarçando o seu mal-estar psicologizando a "coisa")

OPÇÃO B: Ele está descobrindo a sexualidade, (os moderados)

OPÇÃO C: Ele esta aprendendo a cuidar dos filhos. Por que, homem não pode cuidar dos filhos, não é? (os progressistas-liberais de extrema esquerda intelectuais, dentre eles, minha querida "profdoc" Cristina Novikoff, um bálsamo na minha vida)

OPÇÃO D: Ele está querendo chamar a atenção em protesto por tudo que passou nestes últimos tempos (os contemporizadores sociologizando a mesma "coisa")

OPÇÃO E: Este menino vai é ser "viado" mesmo! (muitos, em off, é claro!)

OPÇÃO F: Nenhuma das anteriores (mas esta opção não é aceita na pedagogização da "coisa")

E eu ali, realizando uma pesquisa disfarçada sobre o assunto, coletando os dados, tratando-os e analisando os resultados!

Mentalmente, catalogava as opiniões. Torturava-me a possibilidade entre assumir uma atitude "firme" com meu filho para não ser julgada e execrada, ou seja, aceita pelos meus pares, ou ainda pior, sucumbir num mar de disfarces, meias-mentiras, mentiras inteiras, hipocrisias...

Optei pela lealdade aos meus princípios. É neles que está o amor incondicional ao
ser humano e o respeito às diferenças, que só se consolidam se você tiver um compromisso real com a verdade. A sua verdade. Possibilitando àquilo que é estranho, ser familiar. Esta postura é uma daquelas onde a gente bota a cara, sabe, e leva muita, mas muita porrada (não é Aninha?).

Meu filho é um ser humano. Pode ser diferente ou não no sentido convencional das opções sexuais. Mas isto não é importante. É apenas uma categoria de análise. Logo, não posso abrir mão dos meus princípios, pois eles constituem a minha identidade. Mantenho-me fiel a eles.

Bem seja o que for que representa a boneca para o meu filho, o fato é que ele está feliz da vida com o seu brinquedo novo e está me pedindo outra...

O fundamental, importante e imprescindível é o amor que sinto por este mini-humano e a admiração profunda que sinto ao vê-lo cuidar tão amorosamente do irmão menor, pela sensibilidade em perceber só de olhar meu rosto, o meu estado de ânimo, mesmo se tento disfarçar (e me alertar!), pela preocupação com a o coletivo, demonstrada nas pequenas atitudes cotidianas, como não jogar papel de bala no chão ou recolher as garrafas pets que meu pai insiste em atirar no seu quintal; em demonstrar bom caráter ao não contar mentiras muito punks (aquelas que sacaneiam alguém ferindo seus sentimentos), pela comoção sincera quando vê um desvalido, pela alegria com que admira a beleza de uma florzinha safada no jardim da minha mãe e colhê-la e colocar num copo me oferecendo; ao adorar incensos e gostar livros, não com a devoção que eu gostaria, mas ok, e ao profundo amor que devota à sua Bolinha.
Me emociono ao vê-lo dormir e me assusto com a rapidez com que está tendo que amadurecer, pois a vida não tem sido fácil para ele.
Sendo assim, é muito fácil ser mãe deste ser humano de sete anos que me chama de mamãe. E se ele for gay, lésbica, hetero, bi, drag, transformista ou desejar uma cirurgia de mudança de sexo, tudo bem. Mesmo. O importante é que seja qual for o caminho escolhido, que seja pautado pelos princípios humanitários. Aqueles que fazem a gente ser decente e não nos torna indiferentes às misérias do mundo. E de quebra, que ame o seu próximo, respeitando a dignidade alheia. E que sonhe sempre com um mundo melhor, como antídoto para afastar o cinismo que ronda o cotidiano da perversidade.
Antônio, eu te amo meu filho.
Por tudo. Mas principalmente por me fazer olhar, de forma corajosa para dentro de mim mesma.
Com amor,
Mamãe.

Fonte:http://denisezinha.blogspot.com/2009/01/meu-filho-me-pediu-uma-boneca_03.html

Foto: Campanha " Orientação sexual não é uma escolha" da fundação canadense Emergence.